Por Djalma Andrade
No
tocante ao exercício de minha profissão, tenho observado e concluído muitas
questões referentes ao comportamento humano. Recentemente, cheguei à conclusão
de que o complexo de inferioridade se comporta igualmente a um câncer silencioso,
que vai anulando a sua vitima aos poucos, sem pressa, ao nada da vida.
Diariamente,
passam por mim dezenas de pacientes. Entre um atendimento e outro, tenho notado
que, na maioria dos casos, algumas queixas se repetem, dentre elas a falta de
autonomia: falta de autonomia profissional, conjugal, familiar, afetiva,
social, financeira e, principalmente, falta de autonomia para gerir a própria
vida.
Tenho
observado que tal realidade tem ligação direta com alguns complexos que se
formaram no tocante à construção da história de vida, dentre eles sobressai o
complexo de inferioridade. Percebo
que são pessoas que têm projetos belíssimos, objetivos e sonhos, porém nunca deram
um passo adiante na vida, em outras palavras, não conseguem sair do lugar. E,
quando dão o primeiro passo, geralmente desistem antes do segundo. E isso
alimenta, cada vez mais, o sentimento de baixa autoestima, sensação de
impotência, vazio, inutilidade e apatia diante da própria vida. É no bojo desses sentimentos que se alimenta a
sensação de sujeito indigno, isto é, a pessoa passa, cada vez mais, a
acreditar, piamente, que não é digna de conquistar nada, e a vida acontece
desse jeito.
Mas,
enfim, como se desenvolve o complexo de inferioridade? É claro que não podemos
falar de uma fórmula precisa, mas tenho observado que a primeira infância se
constitui como terreno fértil para germinação da questão. E explico o motivo: naturalmente,
o desenvolvimento psíquico humano se dá em duas sociedades: a micro sociedade e
a macro sociedade. A micro sociedade
corresponde a primeira e diria que a mais importante à formação psíquica do
sujeito. É a sociedade família, onde se aprende e apreende os valores éticos e
morais, os quais nos orientarão na macro sociedade, que é a sociedade que
perpassa a família, englobando o social no todo.
Infelizmente,
em nossa cultura, o desenvolvimento do sujeito na primeira sociedade, isto é,
no seio da família, dá-se, em muitos casos, em pé de comparação: é sempre o coleguinha
que sabe se comportar, é sempre o coleguinha que tira as melhores notas na
escola, resumindo, é sempre o coleguinha que vai ser alguém na vida, é sempre o
outro. E é a partir dessas informações externas e familiares que a criança vai
formando a sua autoimagem, e é justamente com ela que ele se apresenta a macro
sociedade, relacionando-se e interpretando o mundo a partir dela.
Geralmente,
o ciclo de amizades dessas pessoas é muito empobrecido e fragmentado, sem
solidez e constância, pois, como mecanismo de defesa, acabam desenvolvendo
sentimento de inveja para com os amigos, o que acaba se tornando uma amizade desagradável,
e o afastamento se torna inevitável. Ele costuma desenvolver o lema do
coitadinho, da vítima, e o mundo sempre está contra ele, até Deus. Além disso, quem sofre de complexo de
inferioridade é muito comum que desenvolva comportamento de possessão no tocante
às relações de amizade, conjugal... pois o outro que se aproxima de seus próximos
é sempre visto como uma possível concorrência, ameaça, mas na realidade se
trata mesmo é de insegurança.
No
complexo de inferioridade, o sujeito se enquadra no típico “carrega o mundo nas
costas”. É aquele tipo prestativo em excesso, e sofre com o complexo do “sim”,
isto é, diz sim para todo mundo, não consegue falar não para ninguém. A sua
intenção é sempre agradar, é aí que busca seu valor. A nota sempre vem de fora,
ele precisa escutar dos outros, e é por isso que não se cansa de dizer sim. Esse
tipo de comportamento denota, geralmente, uma posição de submissão em relação
ao outo, e é justamente aqui que se desenvolve a falta de autonomia diante
desse outo e também de si, visto a necessidade da confirmação de alguém para
existir como pessoa, o que não é possível.
Nesse
triste lema, a vida acaba acontecendo diante do nada, do zero afetivo e ativo,
sem conquistas, nem mesmo de si. É a cristalização do sofrimento psíquico em
seu grau mais elevado, de onde não tardam os sintomas depressivos e/ou algo da
natureza.