Por Djalma Andrade
Atualmente,
em parte de meu trabalho, tem sido a minha rotina avaliar e acompanhar paciente
com diagnóstico de câncer. É claro que as perguntas são muitas, e as incertezas
superam as certezas. Dentre as minhas
inquietações, uma pergunta sempre em latência: psicologicamente, por que
determinado paciente reage diferente de outros diante do diagnóstico de
neoplasia, por que o sofrimento psíquico é mais visível em uns ao passo que em
outros nem sofrimento parece haver? Ao
longo do tempo e das avaliações busqueis elementos para tentar responder a tal
pergunta.
Aos
poucos fui entendendo que a resposta está em uma via de mão dupla: fora e
dentro do paciente. Quando digo fora, refiro-me aos estigmas que norteiam o
diagnóstico “câncer”, que passa pelo crivo da cultura; dentro, estou
sinalizando a personalidade do indivíduo. Depois desse achado, eis que surgiu
mais uma pergunta: a personalidade pode interferir, a ponto de anular a dor
psíquica de um paciente com câncer?
Depois
de mais um tempo de estudo e observações, conclui que não. Entendi que a
personalidade do paciente tem papel importante, mas não para anular o
sofrimento psicológico, e sim para definir o modo pelo qual o indivíduo vai
lidar com tal realidade de dor. E você pode perguntar: não seria demais
generalizar? Bem, vamos lá... Se eu estivesse falando de uma questão tão
somente a partir de fatores “internos” ao paciente, diria que sim. Acontece que
estou olhando também para os fatores externos ao paciente com câncer, fatores
estes que todos estão expostos, vulneráveis: o principal causador de alterações
emocionais e, portanto, comportamentais, não diz respeito tão somente ao
diagnóstico em si, mas principalmente aos estigmas que apontam e pesam para uma
mesma e única direção: sentença de morte.
Diante
de tal sentença, é comprovado, até mesmo pela nossa própria evolução genética,
que todo e qualquer organismo, inconscientemente ou não, reage. No bojo de tal
reação, torna-se inevitável, no âmbito psicológico, a vivência de sentimentos
de medo, ansiedade, impotência, insegurança, tristeza, angústia, às vezes
raiva, culpa, solidão, vazio, negação, estresse aumentado e/ou algo da
natureza.
Tais
sentimentos se reverberam na vida psíquica do paciente com câncer de forma
direta ou indireta.
Quando diretamente, os sintomas são visíveis, e o
"desespero" do paciente é patente; indiretamente, o paciente reage
por meio de mecanismo de defesa, que vai depender da personalidade e meio
cultural do indivíduo. São muitos comuns mecanismos de defesas tais como:
intensificação da crença religiosa, positivismo, esperança aumentada, supervalorização
da vida, alto astral elevado, motivação para dar e vender... Inicialmente, é
assim que essas pessoas chegam para mim, e realmente contagiam o ambiente; mas
na hora da pergunta mágica que costumo iniciar as sessões: “o que você traz”?,
os mecanismos desabam, e a dor está lá, ancorada nos estigmas, em águas
sentenciosas, a morte. O que não passa de um estigma socialmente construído,
pois é comprovado, cientificamente, que mais de 60% dos casos de câncer, quando
diagnosticado precocemente, é tratado e curado.
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