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terça-feira, 8 de setembro de 2015

A PSICOLOGIA DO CU E O JARDIM DO ÉDEN



                                                                                                                                  Por Djalma Andrade


Se você achou estranho o título desse texto que a partir de então começa a ganhar corpo, é porque significa dizer que realmente somos estranhos, e isso é tudo o que não gostaríamos de ser, estranhos. Ser expulso do conforto científico das palavras é uma deselegância violenta: o vulgar nos dedura sem cerimônia.

 Sou tentado a sair desse corpo vulgar, ele é falível por ser assim. Preciso construir um paraíso onde eu e você, caro leitor, juntos, ultrapassemos as reais possibilidades desse corpo esburacado. Esburacado pela sua própria natureza violenta de ser.

O termo paraíso é airoso e, em sua própria elegância de existir, sugere fantasia... eis a palavra chave! Ficou confortável? Diria que tão confortável quanto o famoso mito do “Jardim do Éden”, em um bom e elegante inglês: “Eden's Garden”. Eu gosto de trabalhar com o Jardim do Éden porque ele não é uma utopia, ele existe e compõe a realidade psíquica do bebê. Sob os cuidados da mãe, quem não diria que o bebê está em um paraíso? Já estivemos lá!

Paraíso este que se sustenta justamente em sua natureza de inexistência de trabalho; onde as necessidades são satisfeitas de forma mágica. O mundo do bebê é um mundo mágico. Mágico não no sentido literal, mas mágico no sentido de realidade mesmo: é o bebê que chora e peito cheio de leite vem, saciando seus desconfortos e desejos a partir de um simples “abracadabra”. Não nos esqueçamos de que, quando o Homem é expulso do Jardim do Éden, a primeira ressalva que lhe é feita é de que, a partir de então, ele se sustentará de seu próprio trabalho; ou seja, a têta cheia de leite não estará mais a sua disposição quando ele chorar. E nos momentos de dores, somos atropelados pelo jargão das palavras: “eu quero a minha mãe!” Mas o que se busca mesmo é o Jardim do Éden, perdido para sempre, a têta!

Ser expulso do Éden implica em tomar consciência do próprio corpo, corpo falível que contradiz o mágico e, portanto, a onipotência real do mundo do bebê. Na lógica do Éden, pode-se comer todos os frutos, desde quando estejam dentro dos muros da fantasia,  eis a questão pela qual tais frutos aparecem na literatura bíblica sem nome, são apenas frutos. O que não se nomeia fica no plano do imaginário, imaterial; ao contrário do fruto proibido, que aparece com nome: a “maçã”, o material que, ao ser “comido”,   abre os olhos do Homem diante de sua própria condição física, é quando se da conta da nudez. Há um corpo, e comer significa cagar!

Fiz esse percurso justamente para entrar no problema da ANALIDADE, que reflete o dualismo da condição humana: o seu eu e o seu corpo. A analidade e seus problemas surgem na infância. O mais estranho e humilhante de tudo é a descoberta de que o seu corpo tem, localizado na extremidade traseira inferior e fora do alcance dos olhos, um buraco do qual saem cheiros fétidos e, ainda mais uma substância fétida – muitíssimo desagradável para todos os demais e até mesmo para a criança.
Por mais que a criança tente realizar os maiores voos da sua fantasia, ela deverá sempre voltar ao corpo. A princípio, a criança se diverte com o seu ânus e suas fezes, e alegremente enfia o dedo no orifício, cheirando-o, lambuzando as paredes com fezes, brincando de tocar objetos com o ânus, e coisa assim. Esta é uma forma universal de brincar que realiza o trabalho sério de todo o brincar: reflete a descoberta e o exercício de funções naturais do corpo.

Com a brincadeira anal, a criança já se vai tornando um filósofo da condição humana. Como todos os filósofos, porém, ainda está presa a essa condição, e sua principal tarefa na vida passa a ser negar aquilo que o ânus representa: o fato de que, na verdade, ela, a criança, nada mais é do que um corpo, no que diz respeito à natureza.

Os valores da natureza são valores físicos (maçã) os valores humanos são valores mentais (frutos), e embora estes alcem os voos mais elevados, são construídos sobre excremento, impossível sem ele, sempre trazido de volta para ele. É como disse Montaigner, “no mais alto trono do mundo o homem senta-se sobre o traseiro”.


O ânus e seu incompreensível e repulsivo produto representam não apenas determinismo e sujeição física, mas também o destino de tudo o que é físico: deterioração e morte. E por mais que você se ache lindo e maravilhoso, não se esqueça de combinar toda essa sua beleza divinal e narcísica com um cu que caga. É demais! A natureza zomba de nós a todo instante!   

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